Antes de se tornar o astrólogo sensação do Brasil, João Bidu, ele foi um dos grandes locutores esportivos de Bauru e região. Antes de se tornar o cronista João Carlos de Almeida, ele brincou de bola com Pelé. Não preciso me alongar, dê logo o play para ouvir esse grande mestre da comunicação.
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O nome é um dos mais lindos que um clube poderia ter: Crvena Zvezda. Ou Stella Rosa, ou Red Star. Porém, aqui é conhecido como Estrela Vermelha, o mais famoso time da Sérvia. Pudera, afinal trata-se do maior campeão nacional – incluindo na conta os títulos iugoslavos, antes do desmembramento do país. É também o único campeão da Liga dos Campeões e Mundial naquele território historicamente tão turbulento.
Mihajlovic, Jugovic e Savicevic. Quem acompanha um pouco de futebol internacional a partir do final dos anos 1980 deve saber de quem se tratam. Por mais que seja fácil confundir com qualquer Fulanovic ou Sicranovic, tão comuns por aqueles lados, tratou-se de uma geração marcante, prejudicada pelas guerras civis que estouraram no começo da década seguinte. Prosinecki, por exemplo, jogaria a Copa de 1998 pela Croácia. Lembrando que a alcunha “brasileiros da Europa” foi dada a eles, cujo principal estádio, onde o Estrela manda suas partidas, é carinhosamente chamado de “Marakana”.
As ambições de conquistar a Europa começaram a tomar forma com título iugoslavo na temporada 1987/88, quando Stojkovic – para muitos, o grande craque do país na história – ainda fazia parte do elenco. A conquista valeu a vaga na antiga Copa dos Campeões (hoje liga dos Campeões) em 1988/89, que até então fazia jus ao nome, sendo disputada tão só e somente pelo melhor de cada federação. Após despachar o Dundalk, da República da Irlanda, na 1ª fase, o time parou no Milan, que terminaria como vencedor daquela edição.
Restou para 1989/90 a Copa Uefa, perdida nas oitavas para os alemães do Colônia. Outra vez campeão iugoslavo, uma nova tentativa ocorreria em 1990/1991. Na época, era mais raro ver os principais valores de países periféricos partirem para as economias mais fortes. Além disso, o sistema de mata-matas e a menor proporção de italianos, espanhois e alemães davam mais espaço para certas zebras. Sem contar que os clubes ingleses ainda continuavam suspensos dos torneios continentais.
Primeiro, vieram Grasshoppers, da Suíça (1 a 1 em casa e 3 a 0 fora), e Rangers, da Escócia (3 a 0 em casa e 1 a 1 fora), o que garantiu um intervalo de inverno, entre novembro e março, ansioso para o que viesse na primavera. Nas quartas, o duelo foi com o último campeão da extinta Alemanha Oriental, o Dinamo Dresden (dois triunfos, por 3 a 0 em casa e 2 a 1 fora). Nas semifinais é que o bicho pegou, frente ao Bayern de Munique.
Através do site O Gol você encontra os links para o You Tube dos compactos de todas as partidas. E, melhor ainda, com narração no idioma deles! Vale a pena conferir a empolgante vitória em solo bávaro por 2 a 1, de virada, no jogo de ida, com cerca de quinze mil sérvios no estádio rival. Fora ainda admirar o espetáculo proporcionado pela fumaça e sinalizadores tanto nas partidas dentro como fora de casa.
O empate por 2 a 2, que garantiu a presença na decisão, foi mais do que dramático. Também histórico, com a classificação vindo em um gol contra aos 45 do segundo tempo, o que deve ter feito Belgrado tremer mais do que qualquer bombardeio. A final, em Bari-ITA, infelizmente não foi à altura. Os alvirubros e o Olympique, de Marselha-FRA, pouco quiseram arriscar e só os pênaltis definiram um inédito campeão após 120 minutos sem gols.
Junto com o Steaua Bucareste-ROM (também Estrela, segundo a tradução) em 1985/86, são os únicos ganhadores vindos da Europa oriental. E, como os romenos, levaram ainda o título intercontinental no Japão. Já sem três de suas principais estrelas, casos do goleiro Stojanovic, do meia Prosinecki e do atacante Binic, o time contou com um jovem Jugovic, 22 anos e autor de dois gols, para superar o Colo Colo-CHI por 3 a 0. Comandando os sul-americanos, estava Mirko Jozic, conterrâneo campeão mundial sub-20 por seu selecionado em 1987.
Visto das alturas, no vôo que me traz a Tel Aviv, pela companhia El Al (um dos símbolos do orgulho local), o Bloomfield Stadium parece ter bem mais do que os 17.500 lugares que a capacidade alegada no site do Maccabi Tel Aviv, maior vencedor na história do Campeonato Israelense, com 19 conquistas – conta que soma as taças levantadas antes do surgimento de Israel como país autônomo, em 1948, quando o território ainda se encontrava sob Mandato Britânico.
“É como o Flamengo daqui”, me explica, ao ver a camiseta amarela e azul, o funcionário do aeroporto que inspeciona minha mala (a preocupação com a segurança permeia praticamente todos os ambientes públicos por esses lados conturbados). “Infelizmente, você não poderá embarcar com ela”, diz, até eu me dar conta de que era apenas uma brincadeira com a minha escolha quase acidental. Afinal, foi nada mais que a primeira camisa de um time local que encontrei em uma lojinha, enquanto caminhava pela moderna orla da capital “extraoficial” do país. Por motivos diplomáticos, as demais nações escolheram Tel Aviv, e não Jerusalém – onde encontramos o Parlamento e todas as outras instituições governamentais – como sede de suas embaixadas.
Mais tarde, em um shopping, veria a vestimenta vermelha, com finíssimas linhas brancas horizontais, do Hapoel Tel Aviv, quem, a princípio, pensava ser o grande bicho-papão do futebol local. Simplesmente porque integra um dos grupos na fase principal da Liga dos Campeões 2010/11. Com 11 títulos nacionais, o atual campeão, que joga no mesmo estádio, tem um número menor de estrangeiros no elenco (quatro contra seis). Na contagem de brasileiros, empate, só um pra cada lado. O rival da cidade esteve presente na fase principal do europeu pela última vez em 2004/05. E olha que chegou, em seus domínios, a vencer o Ajax-HOL por 2 a 1 e arrancar o 1 a 1 frente a Juventus-ITA.
Outro Maccabi, da bela e portuária Haifa, também é forte por lá. Da mesma montanha onde foram construídos os Jardins Persas da antiga religião Bahai, se tem uma visão magnífica do Kiryat Eliezer Stadium, com capacidade para 14.000 espectadores. Aliás, por aí se vê que a megalomania em suas arenas não é sintoma do futebol por lá, uma vez que os índices populacionais israelenses são modestos. Empatado com o Hapoel na corrida dentro de suas fronteiras, o clube verde e preto, em 2002/03, teve de encarar os adversários continentais no Chipre, por motivos de segurança. Na cidade de Lefkosia, conseguiu um sonoro 3 a 0 sobre ninguém menos que o Manchester United-ING.
Aproveitando o gancho: por que os clubes de lá e a seleção fazem parte da Uefa? Bem, de início, Israel integrava a confederação asiática, quando os dois “gigantes” de Tel Aviv faturaram três das primeiras quatro edições da Copa dos Campeões da Ásia. Com o tempo, até o futebol acabou se rendendo ao lado prático da coisa: que, na verdade, trata-se de um território europeu implantado no Oriente Médio. Então, a equipe nacional hoje joga a Eurocopa e disputa as eliminatórias européias para a Copa do Mundo.
E Jerusalém, a cidade de cristãos, judeus e muçulmanos, onde fica nessa história? Aqui, representada pelo Beitar, que carrega o mesmo nome do movimento sionista surgido em 1923 (sionistas são aqueles que pregam o retorno de judeus ao redor do globo para a Terra Prometida por Deus a Abraão). Ostentando o simbólico candelabro de sete velas em seu distintivo, os aurinegros são declaradamente ligados aos movimentos de direita, que refutam qualquer partilha ou negociação territorial com os vizinhos árabes-palestinos. Campeão israelense pela primeira vez em 1986/87, totaliza hoje seis triunfos domésticos.
Dentro da efervescente Universidade de Tel Aviv se localiza o Museu da Diáspora, um registro da religião e cultura hebraicas. Em um de seus painéis, retratos de judeus ilustres e marcantes para a humanidade, casos de Einstein, Freud, Karl Marx, Spielberg e Levi Strauss. Esportistas? Lá está o nadador Mike Spitz, lembrado na clássica foto com sete medalhas de ouro olímpicas no pescoço. Antes de acreditar que a linhagem iniciada lá nos confins do tempo, com as Doze Tribos, seja realmente predestinada a triunfar pelos desígnios divinos, vou esperar antes por um Pelé que use o tradicional kipá na cabeça.
Marcelo Ricciardi é jornalista esportivo da Editora Alto Astral e dono de um texto que passeia com louvor pela metáfora e o diálogo com o leitor – não o caso deste, uma descrição riquíssima após viagem a Israel. O Canhota 10 agradece a experiência compartilhada – e a camisa do Maccabi Tel Aviv!