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Pelé, 70

Nascido em 23 de outubro — e registrado, mais de um mês depois, como do dia 21 —, Pelé está comemorando 70 anos de vida. E, merecidamente, tem sido reverenciado por toda a imprensa, com matérias ricas em detalhes de sua vida. O Bom Dia Bauru trouxe ótimo material hoje (22/10), que se estenderá até domingo. De minha parte, reproduzo texto que escrevi para uma revista especial da Editora Alto Astral (Série Grandes Craques) sobre o Rei. Na ocasião, trouxe os melhores trechos de uma entrevista coletiva de Pelé, da qual participei, e resgatei declarações dadas por ele à Folha de S. Paulo em 1974. Confira.

Série Grandes Craques 1, Editora Alto Astral, capa de Wilson Monaco Jr

COM A PALAVRA, O REI

Sempre que Pelé se manifesta, todos querem ouvir sua opinião

Pelé tem uma agenda apertada. Por isso, cada aparição vira uma oportunidade de ouvi-lo, saber o que pensa o Rei sobre seus súditos – afinal, qualquer ser envolvido com o futebol está abaixo dele. As declarações a seguir, ele deu em uma coletiva em abril de 2007, quando deixou recados importantes.

LEGADO
“Para quem não me viu jogar, é só ver o Pelé Eterno. Dá pra ver o que o Pelé fez. De vez em quando eu assisto e penso: esse cara jogava pra caramba!”

NOVO PELÉ
“Vai ser difícil nascer um novo Pelé. Meu pai e minha mãe já fecharam a fábrica!”

SER EXEMPLO
“Na ocasião do milésimo gol, eu tive a felicidade de pedir mais escolas para as crianças. Acho que todos entenderam a mensagem, não foi demagogia. Pena que a situação da educação piorou. Não devemos parar, temos que lutar. Eu quero dar de volta às crianças tudo o que o futebol me deu. Para isso, eu tento errar o mínimo possível na minha vida. Todos somos humanos, passíveis de erro. Conselho é fácil de dar, mas exemplos, não.”

AJUDAR O BRASIL
“Uma vez que fui à África, num evento da Copa de 2010, a convite do Mandela, ele me perguntou como um país que fala uma língua só, rico e maravilhoso, tem gente morrendo de fome… Ele disse que tinha que falar em várias línguas e dialetos para seu povo entendê-lo. Tenho o sonho de colaborar com meu país. E falta muita coisa pra eu realizar na minha vida. Espero que Deus me dê tempo e saúde para isso.”

SOBRE A COPA DE 2014
“É bom os torcedores saberem que não é pelo fato de a Copa ser no Brasil que vamos ganhar. Será muito difícil. E o único Mundial que tivemos aqui, perdemos…”

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PELÉ DOCUMENTO
Em entrevista a Paulo Matiussi, para caderno especial publicado pelo jornal
Folha de S. Paulo sobre ele em setembro de 1974, o Rei fez declarações para a posteridade:

“Nunca pensei em ultrapassar os limites da lógica. Procurei apresentar um futebol objetivo. O resto, só Deus pode explicar.”

“Em 1970, jogamos com espírito de equipe, sabedores de que o conjunto era mais importante que a necessidade de afirmação pessoal.”

“Sei que nesta nova fase da minha vida [após despedir-se do Santos] terei bons e maus momentos.”

“Todos sabemos que o doping existe. Muitos foram dopados, outros se deixaram dopar, por ignorância.”

“Nunca me preocupei com a compra de árbitros. Meu negócio sempre foi jogar.”

“Quando menino, tinha dificuldade em chutar com a esquerda e cabecear. Aprendi a matar a bola no peito e a fazer outras coisas através dos treinos seguidos e puxados.”
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Foto na homepage: Reprodução/Luiz Paulo Machado

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Bauru Basket

Guerrinha: guerreiro desde 1997

Hoje treinador de Bauru, ele acumulou as funções de jogador e manager na fundação do COC/Ribeirão Preto

O time de basquete de Ribeirão Preto não existe mais. Mas fez história, com cinco títulos paulistas e um brasileiro (2003). Poderia estar aí até hoje, enriquecendo a modalidade, não fosse a bagunça instaurada no Nacional de 2006.

Essa trajetória vitoriosa de Ribeirão tem em seu embrião o empreendedorismo de Jorge Guerra, hoje treinador do Itabom/Bauru. Quando a equipe Dharma/Yara/Franca foi extinta, no final de 1996 – não confundir com o Franca (Vivo) ativo até hoje -, Guerrinha procurou o empresário Chaim Zaher, do colégio COC. Em seguida, veio o apoio da multinacional italiana Polti, nascendo assim o Polti Vaporetto/COC/Ribeirão Preto – a Polti sairia no final de 1998, ano em que levou, já como treinador (veja foto abaixo), o time ao vice-campeonato brasileiro. Em 1999, Guerrinha aterrissou em Bauru, em sua primeira passagem.

Em seu primeiro ano em Ribeirão, além de armador em quadra, Guerrinha assumiu o papel de manager da equipe, treinada por José Medalha. Ao saber dessa história, entendi como foi forjado o perfil do Guerra, que só faltava servir café quando iniciou o desafio do Bauru Basketball Team, na temporada 2008 – era o homem do marketing, do contato com a imprensa, da aproximação com patrocinadores e autoridades. Hoje, o Itabom/Bauru está bastante estruturado nesses setores, mas ele segue na linha de frente, defensor voraz da causa do basquete na Cidade Sem Limites.

Pedido de tempo enérgico desde o começo... Foto de Paulo Arruda/CBB

Abaixo, uma foto de Guerrinha dos tempos de jogador, quando defendia o Dharma/Yara/Franca.

Reprodução/Luiz Doro/revista Basketball World, ed. 11, jan/1997
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Esportes

O melhor parceiro de Romário

Na Copa de 1994: a prova de que Romário não a ganhou sozinhoBebeto tinha fama de chorão. Franzino, sofria com a violência dos zagueiros e desabava como um bebê faminto, com a mão na perna. Um pouco pela pancada, um pouco de cena que onerou muitos beques com cartões amarelos.

Quando surgiu no Flamengo, em 1983, o Galinho estava de saída para a Udinese e logo vieram com o papo de ‘Novo Zico’. Bebeto cumpriria bem a função de meia de ligação, por sua habilidade, mas estar mais perto do gol funcionou melhor para o ótimo finalizador que era. Vestiu a camisa 9 do Rubro-Negro até a final do Carioca de 1989, quando foi comprado pelo arquirrival Vasco. De cara, faturou o Brasileirão com os cruzmaltinos – o terceiro de sua carreira (1983 e 1987 pelo Fla). No mesmo ano, foi artilheiro da Copa América, dado ofuscado pelo gol de Romário, o do título, na final contra o Uruguai.

Aliás, estar à sombra do ‘Gênio da grande área’ foi a função que o consagrou – sem nenhum demérito. Enquanto um era marrento, bad boy, o bom moço da camisa 7 amarelinha era o par perfeito, Oscar de melhor coadjuvante. Recordo-me tanto de juras de amor quanto de alguns desentendimentos entre eles. Agora, ambos aposentados, o respeito é recíproco.

Descrever a vitoriosa carreira de Bebeto é desnecessário aqui. Vale a lembrança, a homenagem. Resumindo, a história do Deportivo La Coruña se define por antes e depois dele. No Flamengo, foram 151 gols. No Vasco, outros tantos. No Vitória, seu primeiro clube, um Estadual e um Nordestão. No Botafogo, um Rio-São Paulo. Pela Seleção, além da Copa América e do Tetra (1994), a Copa das Confederações (1997). Jogou a Copa de 1998 também (sua terceira seguida) e soma seis gols em Mundiais.

Começou de forma tímida sua carreira de treinador este ano (2010), no América-RJ, e agora se aventura na política, como candidato a deputado estadual. Melhor seria ficar quieto em casa, revendo vídeos de suas atuações primorosas e de seus voleios mágicos.

Fotos: reprodução Flapedia

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Entrevista com TOSTÃO

Esta entrevista que fiz com o craque Tostão saiu na edição 8 da revista Gol FC, em abril de 2009. O cronista fala de futebol com clareza, quase que de forma didática, para não dar brecha a interpretações equivocadas sobre o que pensa. Vale a pena conferir. Atente-se para perguntas que o tempo já desgastou (marcadas com ***), mas que as respostas lúcidas merecem apreciação.

TOSTÃO

O cronista mais admirado do país fala com a coerência e a sinceridade que o caracterizam desde os tempos de jogador

Por Fernando BH

A fala é mansa e o sotaque mineiro, inconfundível. Na conversa por telefone com Gol FC, nenhum barulho ao fundo. A serenidade é mesmo a marca de Tostão. Colunista de grandes jornais brasileiros, o doutor Eduardo Gonçalves de Andrade, 62 anos, diagnostica como poucos o nosso futebol. E, apesar de não gostar muito, também fala um pouco de sua gloriosa (e por vezes dramática) trajetória. Desnecessário desejar boa leitura quando o craque da palavra está em campo.

Por que você critica a importância que se dá hoje aos técnicos?
Que fique bem claro que eu os acho importantes, só que a imprensa supervaloriza. Uma substituição qualquer é responsável pela vitória do time. Às vezes a troca foi errada, mas o time acabou ganhando e dizem que foi mérito do treinador. A mesma coisa o contrário, quando perde e ele substitui bem. O futebol tem tantos detalhes para o pessoal se concentrar tanto no técnico… ‘O time do fulano’! Há um exagero na relação de imprensa e torcedor com o técnico.

O papel do manager não agrada a diretoria do São Paulo. Será difícil vermos Vanderlei Luxemburgo dirigindo o Tricolor? ***
Essa é uma grande qualidade do São Paulo. Um dos motivos de estar à frente dos outros. Lá, o técnico é somente técnico. Apesar de a imprensa continuar dizendo que ganha por causa do Muricy… Claro ele é bom, eficiente, conhece futebol, é sério, sabe organizar um time. Mas são coisas que todo bom técnico deveria fazer. O que não pode é achar que ganhou um jogo só porque mudou o Richarlyson dois metros pra esquerda ou pra direita.

E o que é aquela rispidez com a imprensa?
Ele não tem paciência de ficar respondendo a muitas perguntas sem sentido. Há outras que não responde porque acha que técnico não tem que dar explicações à imprensa. Aí, vai para as entrevistas mal-humorado. Dá a impressão de que não queria estar ali e tem um comportamento às vezes mal educado e agressivo. Mas há um pouco de extremismo nisso. Não é só o Muricy. Cada um tem seu estilo, mas eu noto que todos os técnicos, com algumas exceções, acham que não têm obrigação de dar explicações. Eles acham o nível das perguntas de alguns repórteres da cobertura diária ruim. Algumas vezes, eles têm razão.

Como seria o Tostão técnico?
Seria mais democrático, tentaria cativar as pessoas com a troca de informações e opiniões. Não gosto do personalismo, do extremismo, o fato de ser o grande chefe, todos obedecendo, o que é comum no Brasil. Muitos ex-jogadores não conseguem ser bons técnicos porque não conseguem passar de uma função para a outra. O Renato Gaúcho continua agindo como se fosse a estrela que era como jogador. Se eu fosse técnico, eu ia querer assistir lá de cima. Na primeira derrota do time, iriam falar que faltou comando lá embaixo (risos).

E o Dunga? Você já sugeriu que ele se demitisse… ***
Ele não deveria ter sido escolhido, por não ter experiência como técnico. Mas os resultados dele são bons e qualquer pessoa que entenda futebol pode ter bons resultados. Basta que seja uma pessoa bem informada. O Maradona, por exemplo. Todos o achavam a última pessoa capaz de ser treinador de futebol. Vi a Argentina jogar e o time é organizado em campo. O Dunga sabe como colocar um time em campo, é o que todo técnico deve saber. O fato de o Dunga ter resultados iguais aos que teria Parreira, Luxemburgo ou Muricy mostra que, mesmo que seja um técnico que não entenda nada de futebol, qualquer um que entrar ali vai ter o mesmo aproveitamento médio. O mais importante não é o técnico, ele é uma parte. O Brasil pode ser campeão do mundo com o Dunga. Mas quero enfatizar que não é a presença do técnico que vai fazer ganhar ou perder.

No caso do Maradona, a admiração dos jogadores argentinos pelo mito influencia em campo? ***
Pode ajudar, mas não sei dimensionar. Os jogadores o admiram, querem vê-lo bem, mas se a Argentina tiver sucesso, não vou achar que essa é a principal razão.

Por que o Pelé não é tão amado pelos brasileiros como o Maradona é pelos argentinos?
O Maradona encarna o que é o ser humano. Ele se expõe, mostra suas fraquezas. O Pelé é uma boa pessoa, claro, mas passou a vida toda querendo mostrar o que não é. E as pessoas percebem isso. Todos o reconhecem como maior jogador de todos os tempos, mas não têm muita admiração pela sua figura. O Pelé gosta muito de fazer média. Vai à Itália, faz média. Vai à França, faz média. No Brasil, fala outra coisa. O Maradona pode falar besteira, mas fala a mesma coisa em qualquer lugar do mundo.

Já virou lugar comum dizerem que o nível do futebol praticado no Brasil é baixo. Você concorda?
Pela saída de tantos jogadores e pelo fato de que os da Seleção, com raras exceções, estão na Europa, os jogos no Brasil são surpreendentemente bons. Bem disputados, emocionantes, os times taticamente organizados. Há um pouco de erro na comparação com a Europa. Fora uns oito times, os que sobram não são melhores do que os brasileiros. No Brasil, não há jogadores como Kaká, Xavi, Pirlo, Messi, mas há jogadores atuando aqui melhores do que muitos que estão em grandes clubes europeus. Acham tudo uma maravilha na Europa, e não é. É evidente que os melhores estão lá, mas quando se convoca uma Seleção e são chamados apenas um ou dois que atuam aqui, há mais uns quatro ou cinco no mesmo nível dos convocados da Europa. Por exemplo, temos vários goleiros aqui melhores do que o Doni.

O calendário do futebol brasileiro melhorou nos últimos anos. O que falta ser organizado nesse sentido para fortalecer os clubes?
Na verdade, melhorou porque estava um caos, um absurdo. A própria CBF chegou à conclusão de que teria que fazer alguma coisa, pois, mesmo com seus amigos políticos, Ricardo Teixeira não iria se manter no poder. Falta melhorar a estrutura dos estádios sem conforto, com gramados ruins, há a venda de ingressos desorganizada… A Copa do Brasil ser jogada pelos times que atuam na Libertadores e não se fazer Estaduais absurdos, com 20 times.

Mas acabar com os Estaduais não decretaria o fim dos pequenos clubes do Interior do país?
Os Estaduais não devem acabar, apenas serem mais curtos. Os clubes do Interior podem jogar em até cinco divisões do Campeonato Brasileiro. Os que tiverem competência e forem organizados vão subindo. E a Copa do Brasil pode passar para 128 times, aumentado apenas duas datas, incluindo mais uma fase entre os pequenos. Pode-se chegar a mil clubes! Não precisa aumentar o número de jogos dos grandes, apenas incluir fases preliminares entre os pequenos. Não há segredo nenhum.

Qual sua posição em relação à Copa de 2014?
Eu quero ver uma Copa do Mundo no Brasil desde que o dinheiro público seja gasto para trazer benefícios posteriores para a população. Que as melhorias sejam preservadas e não se invista dinheiro público reservado para assuntos mais urgentes. Assim, seria ótimo ter uma Copa. O penoso é que acontecem muitas coisas políticas, desperdício de dinheiro, como houve no Pan 2007. Disseram que o Pan era para o bem público, gastaram uma fortuna, mas não melhorou em nada a estrutura do Rio.

Com a África do Sul correndo contra o tempo e a incógnita brasileira, será difícil chegar ao nível da Alemanha 2006? ***
Não temos obrigação de fazer uma Copa moderna. É como uma pessoa sem recursos financeiros dar uma grande festa para impressionar. O Brasil tem que fazer uma coisa organizada, mas que não haja nada tão exuberante. E é um mito esse rigor da Fifa, de que tudo é perfeito. Na Alemanha, cansei de ver coisas que, se fossem no Brasil, todos iriam criticar. Estádios com problemas, centros de imprensa mal aparelhados. Em dois jogos da Seleção em Dortmund, havia jornalistas sentados no chão.

Quando você decidiu ser profissional, foi por perceber que seria diferenciado. Hoje, muito garoto acha que é diferenciado e não é…
É natural verem no futebol a chance de crescer na vida. Mesmo não tendo muito talento, o garoto acha que pode ganhar dinheiro e destaque. Se ilude com elogios antes da hora. Quando o Denílson estava prestes a ir para a Europa, eu o entrevistei. Ele disse que em pouco tempo seria o melhor jogador do mundo. Aí perguntei: ‘Mas você não acha que precisa aprender a cruzar melhor?’. Ele disse sim. ‘Chutar melhor?’. Sim. Outras perguntas, ele concordando. ‘Realmente, tenho que melhorar muito!’. Ele tinha uma habilidade extraordinária, mas não tinha vários fundamentos técnicos para ser um fora de série.

O Robinho vive falando que quer ser o melhor do mundo…
Se o Robinho tivesse consciência crítica de suas limitações, teria avançado mais. Ele é inteligente, muito melhor jogador do que o Denílson, nem se compara. Ainda tem uma grande chance de disputar o prêmio de melhor do mundo. Já o Kaká tem senso crítico, é um jogador que batalhou pelo que precisava melhorar, foi crescendo. Ele é uma exceção.

O que você espera do Ronaldo no Corinthians? ***
A expectativa é que ele jogue o que jogou no Milan, isto é, atuar de vez em quando e ter alguns momentos do grande Ronaldo que foi. Mas não dá para esperar dele regularidade, fazer muitos jogos no auge.

E, agora, mais perto da área.
Sim, em espaços mais curtos. O Romário se adaptou a isso, até não sair mais da área, tanto que jogou até os 40. Os mais jovens acham que o Romário foi sempre um centroavante. Ele era um espetáculo do meio para a frente. Tabelava, driblava.

Certa vez você disse que, na Copa de 1970, cederia sua camisa ao Romário…
Naquela posição de centroavante ele foi melhor do que eu. Não é falsa modéstia, é consciência. Ele foi o maior do mundo naquela posição. Ele e o Ronaldo.

A afirmação serve para o Fenômeno também?
Sim. Serve também para o Reinaldo, o Coutinho, o Careca… Todos centroavantes melhores do que eu, porque eu era mais meia do que atacante. Fazia muitos gols também. Mas meu forte era o passe. Jogava como joga hoje o Alex, como o jogou o Zico.

E o Zico foi melhor do que o Zidane, como foi recentemente eleito em uma enquete na TV? ***
Não acho, não. Zidane jogou mais. Eu até achava que o Ronaldinho Gaúcho iria se tornar melhor do que ele, pelo que jogou em dois anos no Barcelona. Mas o Zidane jogou muito durante dez, 15 anos. Eu vi Cruyff jogar, Platini, Zico, todos extraordinários. Mas, depois de Pelé e Maradona – e Garrincha, que é um caso à parte – o Zidane foi o melhor. Alguém pode dizer que o Zico foi mais objetivo, fez mais gols. Mas é cada um na sua função. O Zidane, como meio-campista, foi eficiente, fabuloso.

Na sua autobiografia, você afirma que a vida é curta e há necessidade de viver outras vidas (além de jogador, estudou e exerceu a medicina e hoje é cronista). Tostão tem mais algum sonho?
Dentro da minha vida, sempre desejo fazer coisas diferentes. Mas mudar de profissão, não tenho nenhum plano. De vez em quando recebo convites para voltar à TV, mas, por enquanto, estou tranquilo. Não sou de ficar correndo, fazendo muita coisa ao mesmo tempo. Prefiro fazer menos coisas e me dedicar mais a elas.

MAIS:

– O OLHO ESQUERDO
Como médico e observando os avanços da medicina, em relação ao problema que o tirou do futebol (descolamento da retina): se fosse hoje, você teria sobrevida no esporte?
Teria mais chances. As técnicas cirúrgicas são bem diferentes de 40 anos atrás.

Além do risco de sofrer nova lesão no olho, o que o impedia de jogar?
Eu perdi parte da visão do olho esquerdo. Para minha vida normal, não me atrapalha. Mas, como atleta, precisava dos dois olhos trabalhando juntos. O atleta precisa estar atento a certos detalhes. Se eu tivesse continuado, mesmo se eu quisesse, não seria o mesmo jogador, teria dificuldades, como tempo de bola. Eu não sentiria segurança.

– CRUZEIRO
Você saiu de forma conturbada do Cruzeiro, quando abriu mão dos 15% a que tinha direito. Qual sua relação, hoje, como clube e com a torcida?
Com o clube, nenhuma. E faço questão de não ter, pela minha função de cronista. Preciso ter toda a liberdade. Tenho que manter total independência. Alguns compreendem, outros não. Convidavam-me muito para eventos do Cruzeiro. Nem me chamam mais, porque sabem que não vou. Com a torcida a relação é muito boa. Me surpreendo até hoje. Onde vou, o torcedor cruzeirense me trata com carinho.

– CENTROAVANTE ARMADOR
Você impressionou em 1970 como “centroavante armador”. Como chegou a essa função?
Eu me inspirei no Evaldo, meu companheiro no Cruzeiro. Eu jogava mais atrás e o Evaldo era fora de série atuando como pivô. Quando joguei nas Eliminatórias, com o João Saldanha, eu jogava como no Cruzeiro. Já o Zagallo queria um centroavante mais próximo da área. Quando ele assumiu a Seleção, disse que eu seria reserva do Pelé, pois não imaginava que eu poderia jogar de centroavante. Não me esqueço o dia em que ele resolveu me colocar. Experimentou outros centroavantes que não foram bem – o Roberto e o Dario – e resolveu me testar. ‘Dá pra você jogar nessa posição? Não quero que fique recuando muito’. Eu disse: ‘Perfeitamente. Vou jogar como o Evaldo joga’. Individualmente, não era a posição que eu poderia render mais, mas para a Seleção foi importante.

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Legítimo camisa 8

Toda vez que visito um craque do passado na memória, volto na lembrança mais antiga que tenho dele. No caso de Marco Antônio Boiadeiro, é com a camisa 8 do Vasco da Gama campeão brasileiro de 1989 (o time da foto abaixo) — armava o jogo ao lado de Bismarck e William e, lá na frente, Bebeto conferia.

Essa data exclui, portanto, a melhor fase de sua carreira, no Guarani, quando jogou ao lado de Evair, João Paulo e Ricardo Rocha — na inesquecível final do Brasileirão de 1986, por exemplo (eu tinha só sete anos…). Depois, li e vi muito a respeito. Ele é uma das jóias do Brinco de Ouro.

Lembro-me de ser um jogador baixinho, de meias arriadas e de muito fôlego. Camisa 8 legítimo. Pelo menos no meu entender de como jogava esse número naquela época. Explico: é o meio termo entre o cabeça de área limitado e o armador habilidoso. O meia-direita, enfim. Hoje, todo mundo na faixa central do campo é “apoiador”.

Chutava bem, mas não era de fazer muitos gols. O mais lindo deles, que me recordo, é pela partida de ida da final da Supercopa da Libertadores de 1992, contra o Racing-ARG, no Mineirão. “Boi, boi, boi, boi, Boiadeiro, faz mais um gol pra torcida do Cruzeiro!”, gritava a galera. Pelo time azul, seus colegas de meio eram Ademir ou Douglas, Betinho e Luiz Fernando Flores. Municiou ataques distintos. Na primeira Supercopa azul, em 1991, eram Mário Tilico e Charles Baiano. No ano seguinte, os Gaúchos: Renato (ele mesmo, o atual treinador do Grêmio) e Roberto. Ainda teve a honra de, em 1993, atuar com Éder Aleixo na conquista da Copa do Brasil. No mesmo ano, ficou marcado por perder pênalti contra a Argentina, na Copa América em que Parreira convocou predominantemente jogadores que atuavam no Brasil.

Depois, disputou o Carioca de 1994 pelo Flamengo. Lá vestiu a 7 (a 8 era de Marquinhos). Dividia o meio ainda com Fabinho e Nélio. Sávio surgia como titular ao lado de Charles Baiano. Carlos Alberto Dias e Valdeir The Flash eram banco. Muitas feras juntas que viram o Vasco chegar ao tri estadual.

Veio o Timão na vida de Boiadeiro, o último grande ato. Títulos paulista e da Copa do Brasil, mas sem a titularidade garantida. Aí, começou a costumeira peregrinação até encerrar a carreira, em 1998, e ser, de fato, um criador de gado. Era um jogador simples, daqueles que treinam muito e cumprem seu papel. Segundo o Futpedia, fez sete gols em 143 partidas no Brasileirão.

Vasco Boiadeiro Cruzeiro Flamengo Seleção Guarani
O Vasco de 1989. Em pé: Mazinho, Luiz Carlos Winck, Zé do Carmo, Quiñonez, Marco Aurélio e Acácio. Agachados: William, Sorato, Boiadeiro, Bebeto e Bismarck