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Efeito suspensivo no futebol: jeitinho brasileiro ou aplicação da lei?

Nosso colunista explica de forma bem didática como funciona esse recurso jurídico no futebol brasileiro

Os mais antigos se lembrarão da final do Brasileirão de 1997. Quando Edmundo, então jogador do Vasco, já penalizado com o terceiro cartão amarelo que o tiraria do segundo jogo da decisão contra o Palmeiras, recebeu ordens do banco de reservas para forçar o cartão vermelho. Após ser expulso, o atacante foi levado a julgamento na semana seguinte e seu clube conseguiu o efeito suspensivo da penalidade, deixando-o apto a atuar na partida decisiva e sae tornar campeão brasileiro daquele ano.

Para os mais novos, um exemplo: o episódio Carol Portaluppi. Ocorreu com o Grêmio em 2016, após a filha do treinador Renato Gaúcho adentrar o campo para comemorar a classificação à final da Copa do Brasil e provocar a perda do mando de campo do time gaúcho no último jogo da final do torneio. Ao apresentar o recurso, o Grêmio obteve o efeito suspensivo e pôde jogar em sua arena a finalíssima.

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Mas afinal, esse benefício de efeito suspensivo é um subterfúgio usado pelos clubes ou apenas a utilização correta de um dispositivo de lei?

Explicamos. O sistema de penalidades do futebol é muito semelhante à Justiça Comum brasileira. Os procuradores recebem as súmulas dos árbitros, analisam as infrações cometidas, investigam os atos e, se entenderem que eles são tipificados como infração, oferecem denúncias ao tribunal competente.

Para as competições estaduais, a competência de julgamento é dos Tribunais de Justiça (TJD); nas competições nacionais, a análise é feita pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD). As Comissões Disciplinares são responsáveis pela análise de 1ª Instância, enquanto o Pleno analisa os recursos interpostos pelos vencidos.

Como esses recursos precisam de um período maior para análise, foi instituído o efeito suspensivo das decisões para que o atleta não seja privado de exercer suas atividades profissionais.

Esse efeito é concedido pelo relator do recurso apenas em caráter excepcional, ou seja, quando houver fundado receio de dano irreparável ao atleta ou ao clube penalizado. Por exemplo: como o recurso do Grêmio não seria julgado antes do segundo jogo da final da Copa do Brasil, a demora geraria a ele um dano irreparável, pois não jogaria em seu estádio o último jogo de uma importantíssima competição.

Diante disso, foi concedida a suspensão temporária da decisão até julgamento final do procedimento. Entretanto, deve-se deixar claro que, além do receio de dano, a legislação exige que o relator se convença da verossimilhança do alegado. Em palavras práticas, ele deve fazer um pré-julgamento da linha de defesa e verificar se realmente há possibilidade de reversão da penalidade. Se não houver, ainda que exista o perigo do dano, ele não concederá a suspensão da decisão.

Por isso, as suspensões obtidas pelos clubes ao longo dos anos foram baseadas em permissão legal e materializadas pelos brilhantes trabalhos desenvolvidos pelos seus advogados.

Logicamente, sempre existirão “pitacos” das torcidas adversárias sobre a influência que cada clube pode ter nos tribunais estaduais ou no STJD, mas isso faz parte do futebol – aliás, a rivalidade sadia é o que o transforma na grande paixão brasileira.

 

CARLOS ALBERTO MARTINS JÚNIOR é advogado, especialista em direito desportivo e atua no Freitas Martinho Advogados

Por Fernando Beagá

Mineiro de Ituiutaba, bauruense de coração. Jornalista e mestre em Comunicação pela Unesp, atuou por 16 anos na Editora Alto Astral, onde foi editor-chefe e responsável pela implantação e edição das revistas esportivas. É produtor de conteúdo freelancer pelo coletivo Estúdio Teca. Resenhou 49 partidas da Copa do Mundo de 2018 para Placar/Veja. Criou o CANHOTA 10 em 2010, a princípio para cobrir o esporte local (ganhador do prêmio Top Blog 2013), e agora lança olhar sobre o futebol nacional e internacional.

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