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Vôlei Bauru inicia sequência decisiva na Superliga que coloca Tifanny à prova

Dois dias após a Federação Internacional de Vôlei (FIVB) ratificar que continuará seguindo a determinação do Comitê Olímpico Internacional (COI) sobre a participação de atletas transgêneros no vôlei feminino — o que mantém a oposta Tifanny apta para atuar —, o Vôlei Bauru encara a primeira de uma série de cinco partidas cruciais na Superliga 2017/2018.

A sequência contra as equipes líderes começa nesta sexta contra o Minas (terceiro colocado), às 20h, em Belo Horizonte. No dia 30 (terça), as gigantes recebem o líder Praia Clube, às 19h30. Dia 2, visitam o Osasco (hoje quarto lugar) e dia 7 mandam jogo em Marília contra o vice-líder Sesc Rio. Tem mais:  dia 16, confronto direto com o Barueri por um importante sexto lugar, como expliquei dia desses que deve ser a meta bauruense.



Além de determinante para os anseios bauruenses, essa sequência de jogos coloca Tifanny à prova. Afinal, a hoje melhor pontuadora da competição (5,2 pontos por set) só havia enfrentado um oponente acima do Vôlei Bauru na tabela (Fluminense). A tendência é que essa média, que tanto tem assustado os que se opõem a sua participação — apesar de estar apenas três décimos acima da média de Tandara — diminua após os difíceis confrontos. Mas, se a oposta for ainda mais acionada e tiver bom aproveitamento, pode aumentar essa média e manter viva a polêmica ao seu redor.

O curioso dessa situação é que chego a torcer para os números de Tifanny baixarem um pouco para a poeira baixar também. A pressão sobre a camisa 10 está muito grande, tanto que adotou o silêncio nas últimas semanas diante dos inúmeros pedidos de entrevista que têm chegado à assessoria do time.

O assunto é polêmico, sim. Não há como não ser encarado, debatido, mas numa temperatura mais racional. O próprio presidente do Vôlei Bauru, em entrevista ao CANHOTA 10, sugeriu um debate promovido pela Confederação Brasileira de Vôlei (CBV). Como já escrevi, Tifanny é pioneira e, ao mesmo tempo e inevitavelmente, vidraça. Em silêncio, ela se concentra para encarar as maiores forças da Superliga — e todos estarão de olho nela.

 

Foto: Neide Carlos/Vôlei Bauru

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Reinaldo Mandaliti: “Se Tifanny estivesse fazendo dez pontos, ninguém estaria reclamando”

A participação de Tifanny, oposta do Vôlei Bauru, na Superliga feminina de vôlei, segue rendendo debates. Primeira transexual a atuar na elite do vôlei brasileiro, ela está no olho do furacão de uma discussão que só iria mesmo acontecer quando a liberação pela FIVB tivesse uma situação concreta como exemplo. Portanto, Tifanny é pioneira, mas é vidraça também. Igualmente o presidente de seu time, o advogado e empresário Reinaldo Mandaliti, que falou ao CANHOTA 10 sobre a polêmica e contou detalhes, como o fato de ceder amostras de sangue da jogadora com muito mais frequência do que aCBV (Confederacão Brasileira de Vôlei) exige. Abaixo, em tópicos:

POLÊMICA
Esse assunto já está passando um pouco dos limites. Ver técnico de voleibol que xinga atleta adversária dentro de quadra, falar que ela é diferente… Se ela estivesse fazendo dez pontos, ninguém estaria reclamando. Veja quantas bolas a Tifanny recebeu e quantos pontos fez [nota do editor: ela tem aproveitamento de 46%, não figura entre as principais neste quesito]. A Tifanny tem aspecto físico maior, mas ela tem dificuldade motora numa largada, sofreu um ponto de saque em que foi passar por trás e não viu a bola… Ela fica no bloqueio várias vezes, no terceiro set cai de produção. Esse é o efeito da saída da testosterona do corpo. Ela tem 33 anos e o efeito da redução de testosterona cada vez a prejudica mais. É isso que as pessoas têm que entender.”

COMPARAÇÕES
Quando a Tifanny diz que é só uma mulher forte, eu tenho essa certeza também. Ela não é mais jogadora do que a Tandara, do que a Natália, a Gabi. Na China, há uma menina de 17 anos [Yingying Li] fazendo mais de quarenta pontos. Hoje, a segunda melhor atacante da Superliga é a Bruna Honório, que jogava aqui ano passado. Fez 25 pontos em um jogo. Eu quero mais é que a Bruna faça quarenta pontos, é uma atleta exemplar. Eu não estou preocupado se vou ser campeão ou não com a Tifanny. Há muitos times mais fortes do que o meu, mesmo com Tifanny e Paula Pequeno. Por que ninguém fala de limitar o orçamento do Praia Clube? Para sermos justos, vamos começar pelo dinheiro, não pelo ser humano. O dinheiro é fácil, um bem material. Mas e o ser humano? Vamos parar de demagogia e permitir que as pessoas circulem no meio da responsabilidade social. Não ficar procurando picuinha para justificar por que perdeu para Bauru. Gente, nós quase perdemos para o Sesi [lanterna da competição]. Perdemos para o São Caetano, em casa, com a Tifanny em quadra.”



DENTRO DA LEI
Falam sobre ela ter feito sua construção óssea à base de testosterona e só ter feito redução aos 28 anos. As pessoas não conhecem a lei, porque aos 18 ninguém pode mudar nada em seu corpo [somente a partir dos 21]. A não ser que seja emancipada pelos pais. E com 18 anos o corpo humano está formado! As pessoas ficam dizendo muita besteira em vez de pensar no ser humano. Têm que parar com homofobia. Esse discurso da vantagem física mascara o preconceito.”

EXAMES FREQUENTES
Porque o médico da Conamev [Comissão Nacional de Médicos do Voleibol], que foi macho para falar no Esporte Espetacular, não tirou a bunda da cadeira e veio aqui entrevistar a Tifanny? Quem levou todos os exames para a CBV fui eu. Mando fazer exames a cada quinze dias. A Tifanny não tem evolução de testosterona, só diminui o nanomol por litro [unidade de medida da testosterona no corpo; o limite é 10, ela tem menos de 1]. Só que ninguém vem a Bauru, nós é que estamos informando.”

Tifanny
Por conta da polêmica ao redor de seu nome, Tifanny optou pelo silêncio nas últimas semanas. Foto: Neide Carlos/Vôlei Bauru

DIÁLOGO
Em vez de as pessoas falarem besteira, que venham olhar, acompanhar, fazer um estudo. Minha grande preocupação é a desinformação e a forma como estão levando essa história. Não é assim que se discute. Se a CBV quer discutir, que convoque uma reunião, com médicos, treinadores, jogadoras. Vamos discutir, olhar estatísticas. Se for injusto, ok, vamos limitar ou excluir, não há problema nenhum para Bauru.”

NOVOS TEMPOS
Estamos vivendo num mundo diferente, as pessoas são livres para tomar suas decisões. Mas como tirar um direito, se hoje no mundo discutimos identidade de gênero? A discussão hoje é outra. Discutimos a evolução do ser humano. Ninguém vai voltar no tempo. Esquece, isso não vai acontecer. As pessoas não toleram mais esse tipo de coisa.”



POSSÍVEL PROIBIÇÃO
Eu não tenho temor nenhum. Acho que vai haver mudanças, mas não acho que o caso Tifanny vai mudar. Porque havia uma regra que tinha que fazer a cirurgia de adequação sexual. Agora, aumentou a possibilidade, não precisa mais fazer a cirurgia, apenas estar dentro do limite de nanomol por litro. O que pode acontecer é retroagir, voltar a ter que fazer a cirurgia [que Tifanny fez].  Não me sinto preocupado, até porque ela tem o direito adquirido de disputar a temporada. Qualquer mudança não vem para agora, qualquer juiz dá uma liminar, ela tem o direito de exercer a profissão que permitiram por uma lei. Como se dá um direito depois tira?”

OPORTUNIDADE
Quando o Vôlei Bauru abriu as portas para ela treinar, primeiro eu estava fazendo algo por um ser humano. Lógico, a partir do momento que ela estava dentro de uma lei que disciplina. O primeiro princípio, antes de ser esportista, é preocupar-se com o próximo. Só que algumas pessoas do esporte não se preocupam com isso.  A Tifanny ficou sem clube na Itália por causa de uma contusão, veio aqui para se recuperar. Vou deixar de dar uma condição a uma atleta, que já passou por todo o preconceito na vida? Ficar excluída? Desculpe, eu sou ser humano.”

 

Foto topo: Bruno Freitas/Noroeste