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Conclusões de uma Copa das boas

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Casillas ergue a taça, repetindo gesto da Euro 2008: Fúria absoluta!

O primeiro termo expressado pela maioria dos comentaristas após o apito final de uma decisão é “título merecido”. Convenhamos, dificilmente um campeão não é digno de levar a taça. Até porque, fosse a Holanda, a Copa do Mundo estaria em boas mãos – mais pela trajetória até a final do que pelo festival de faltas e cartões que os laranjas promoveram contra a Espanha. A Alemanha também faria jus, com seu futebol eficiente, veloz. Aliás, os germânicos ficam entre os três primeiros há três Copas, desempenho louvável.

Final Copa do Mundo Fifa 2010 Espanha Holanda
A expectativa era de um jogo clássico, técnico, mas o que se viu foi muita pegada...

Uma passada pela final antes de, em tópicos, resumir o que foi este Mundial da África do Sul. O primeiro tempo foi de cochilar. Muito estudo, erros de passe, marcação pesada. Ninguém queria ir para o intervalo perdendo. No segundo, a Holanda acordou quando Sneijder finalmente se fez notar. A ótima assistência do camisa 10 deixou Robben de frente para Casillas. Soubesse finalizar com a direita, o atacante teria driblado o goleiro. Preferiu chutar por baixo e o capitão espanhol, com a ponta do pé, começou a colocar a mão na taça.

Gols perdidos aqui e ali, uma certa displicência nas finalizações e uma irritante preciosidade espanhola em querer chegar dentro da área. Esse cenário se arrastou até os dez minutos do segundo tempo da prorrogação, com muitas interrupções por pontapés e reclamações. Até a Fúria, merecida vencedora do troféu Fair Play, cometeu muitas faltas e recebeu mais que o dobro de cartões do que havia levado até a final – e Iniesta poderia ter sido expulso por uma entrada sem bola em Van Bommel. Heitinga foi tarde quando recebeu o vermelho. Bateu sem dó o tempo todo, mas nem assim intimidou os espanhóis.

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Iniesta quebra o protocolo e homenageia futebolista espanhol falecido

O gol da vitória foi a síntese da campanha de La Roja: insistindo na qualidade do passe, uma hora a rede balança. A exemplo da França no início da década, a Espanha é a atual campeã europeia e mundial. Chegou como favorita, deu de ombros para as desconfianças após a derrota na estreia, para a Suíça e, muito mais do que confirmar as previsões do polvo Paul, cravou o palpite de Pelé, até ontem um pé frio em opiniões futebolísticas.

Agora, aos destaques e curiosidades da 19ª Copa do Mundo de futebol:

• Que o comitê brasileiro tenha observado bastante os erros da África do Sul: transporte caótico, insegurança nas ruas, gramados ruins, falhas de organização nos estádios (acesso, cambistas) e a permissividade com as vuvuzelas – que não surja nenhum instrumento semelhante por aqui… E que o acerto mais evidente dos sul-africanos, o aeroporto de Johanesburgo, seja exemplo para nosso caos aéreo.

• Pela primeira vez, a Fifa permitiu que as seleções levassem três jogos de calções e meiões para facilitar a diferenciação de cores nos confrontos. Espanha, Holanda, Uruguai e Portugal se utilizaram desse expediente.

• Para o tamanho da expectativa sobre eles, Messi e Kaká realmente ficaram devendo, em relação a resultado. Porque jogaram bem, sim, até as oitavas. O mau desempenho de ambos no jogo da eliminação de suas seleções é que configurou o fracasso. Já Rooney e Cristiano Ronaldo realmente decepcionaram. O inglês estava em más condições físicas e tem desconto. O português precisa chutar a vaidade e comer um pouco de grama.

• Pela quarta vez seguida, o melhor jogador da Copa não é do time campeão. A última vez que isso aconteceu foi com Romário, em 1994 – incontestável. Ronaldo (1998), Oliver Kahn (2002) e Zidane (2006), vice-campeões, levaram nas Copas seguintes. Neste ano, mais surpreendente: o uruguaio Diego Forlán, quarto colocado, ganhou o prêmio, eleito pelos jornalistas credenciados no Mundial. Tivesse ido para Xavi ou Casillas, também estaria em boas mãos. Sneijder, por sumir no momento decisivo, não – por isso o erro da Copa de 2002, eleger antes da final. Ora, o desempenho no momento mais importante é que define o craque, o fora-de-série, o que sabe lidar com a pressão!

• Os vencedores dos prêmios concedidos pela Fifa:
Bola de Ouro: Diego Forlán (Uruguai)
Bola de Prata: Wesley Sneijder (Holanda)
Bola de Bronze: David Villa (Espanha)
Chuteira de Ouro: Thomas Müller (Alemanha), no critério de desempate: mais assistências e menos minutos jogados do que Villa, Sneijder e Forlán, que também fizeram cinco gols.
Luva de Ouro: Iker Casillas (Espanha)
Melhor jogador jovem: Thomas Müller (Alemanha)
Fair play: Espanha
Não consta na relação da Fifa o prêmio de seleção que mais entreteu o público, que em 2006 ficou com Portugal.

Desnecessário voltar à Seleção Brasileira. Você pode ler a minha opinião sobre o desempenho do time de Dunga aqui.

• A imprensa brasileira precisa se reciclar para 2014. Ego de jornalista esportivo é espaçoso e uma Copa aqui aumenta a responsabilidade de um bom trabalho… Precisamos de mais respeito, coleguismo – não confundir com corporativismo barato – e menos vaidade, competitividade rasteira.

• Por fim, minha seleção da Copa está na seção times imaginários e, se não foi um campeonato brilhante, com destaques individuais que saltaram aos olhos*, houve muita emoção, jogos com reviravoltas fantásticas, belos gols. A média (2,26 por partida) reflete pouco esse cenário. Como eu já escrevi em outra oportunidade, na coluna do jornal Bom Dia Bauru, foi uma Copa de qualidade de gols, não quantidade.

* A tão bombardeada Copa de 1994 foi, talvez, a última a ter vários craques-solo, aqueles que empurraram seus times e encantaram multidões: Hagi (Romênia), Stoichkov (Bulgária), R. Baggio (Itália) e Romário (Brasil).

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Seleção da Copa 2010

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Quer discordar? Listar sua seleção da Copa? Deixe sua opinião nos comentários!

Casillas: seu desempenho, principalmente na final, e sua trajetória nesta década o credenciam a se intitular o melhor goleiro do mundo, apesar de Julio Cesar.

Sergio Ramos: a maioria mencionará Lahm, da Alemanha, mas esse zagueiro que se encontrou na direita impressionou. Eu, que não gosto do estilo dele, tive que dar a mão à palmatória.

Lúcio: não é por ser brasileiro, mas por seu jogo vibrante, sua entrega, seu ótimo posicionamento. A exemplo de 2006, fazia uma Copa impecável enquanto o Brasil esteve nela.

Piqué: se Puyol dá seus sustos de vez em quando, esse garoto é pura sobriedade.

Van Bronckhorst: outro lateral que surpreendeu. Para quem chegou à aposentadoria, um Mundial coroado com o golaço sobre o Uruguai. Firme na marcação e bom no apoio.

Schweinsteiger: encontrou a maturidade, alia velocidade e passe preciso. Um volante moderníssimo que deu ritmo ao jogo alemão.

Xavi: não cabia ele e Iniesta nos onze, então que fique o cérebro do meio-campo espanhol. O estilo cadenciada, de toque bonito e envolvente da Fúria é personificado por ele.

Sneijder: foi o cara da Holanda, que chegou 100% à decisão com sua participação relevante, sobretudo seus cinco gols. Tivesse se imposto na final e levado o título, seria o craque da Copa.

Müller: revelação, artilheiro, nada mal para um garoto de 20 anos…

Forlán: exagero dizer que carregou o Uruguai nas costas, mas foi daqueles caras que chamam a responsabilidade. Saiu premiado pela Fifa como melhor da Copa.

Villa: cinco dos oito gols da Espanha campeã do mundo foram dele. Isso basta para estar nesse time.

Lahm, Capdevilla, Iniesta, Özil e Robben ficaram de fora por pura falta de espaço.

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Laranja x Fúria

Ah, os números…
(Texto publicado na coluna Canhota 10 do jornal Bom Dia Bauru de 8 de julho de 2010)

Inicio a coluna com a mesma frase da semana passada: números ajudam a entender o futebol. Apenas entender, pois esse esporte não prima pela exatidão, como o Uruguai provou nas quartas, superando Gana de forma inacreditável. Mas, definida a grande final da Copa do Mundo, um passeio pelos dados (oficiais da FIFA) trouxe alguns pontos interessantes para imaginar como será o duelo de 11 de julho.

O genial Xavi também concorre a melhor do Mundial

Vendo o estilo jogo da Espanha, parece ser um time que cisca, cisca e pouco finaliza. Melhor olhar direito. É o time que mais chutou a gol no Mundial: 103 vezes – a Holanda, 80. Como explicar, então, os míseros sete gols em seis partidas da Fúria? A pontaria. Apenas 39% foram no rumo da baliza – os da Laranja, mais eficientes, 51% e média de dois gols por jogo.

O preciosismo Espanhol foi bem ilustrado pelo incrível gol que Pedro perdeu contra a Alemanha, na semifinal de ontem. Como não passou aquela bola para Fernando Torres, livre? La Roja abusa do toque de bola. Foram exatos 3.387 passes, 81% deles certos – o time de Van Bommel, 72%. Tantos toques a ponto de os súditos do rei Juan Calos sempre se aproximarem da área adversária e, consequentemente, ficarem pouco em impedimento (foram apenas seis vezes no torneio – os súditos da princesa Máxima, 24 vezes!).

A Holanda é famosa por atuar com pontas. Deduz-se, então, que vai muito à linha de fundo, certo? Foram 87 cruzamentos na área adversária – a Espanha, entretanto, centrou 146 vezes (68% a mais). Os holandeses sempre foram elogiados pelo futebol solto e ofensivo, mas insuficiente para ganhar uma Copa. Pois eles aprenderam a endurecer o jogo. São a seleção mais faltosa e mais punida com cartões na África do Sul: 98 infrações e 15 amarelos – os espanhois são os segundos que menos fizeram faltas (62), receberam apenas dois cartões e foram os que mais apanharam (106 vezes).

Sneijder, forte candidato a artilheiro e craque da Copa

Como pode notar, pelos números a Fúria pode fazer suco da Laranja. Um chocolate técnico, de poucos gols e muitos toques de efeito – principalmente nas tabelas entre Xavi e Iniesta. Mas a Holanda não joga como a Alemanha. Os comandados de Vicente Del Bosque atacam com perigo com poucos jogadores, isto é, sem se expor ao contra-ataque (a arma alemã). Os herdeiros de Cruyff dependem muito do estilo cadenciado de Sneijder e, para tanto, obrigarão os espanhois a um jogo aberto, lá e cá. Garantia de bom jogo para o público.

Ah! As duas seleções nunca se enfrentaram em Copa do Mundo e, em toda a história, foram apenas oito confrontos, que derrubam o baile espanhol das estatísticas desta Copa: quatro vitórias da Holanda, três da Espanha… Que venha o domingo, que vença o melhor. O futebol já saiu vitorioso.

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Reflexão de cabeça fria

Kaká teve bons momentos. Seu único erro foi omitir que jogou no sacrifício durante e contar depois, como desculpa

Ainda durante a partida contra a Holanda, pelas quartas desta Copa 2010, quando o Brasil dava nítidos sinais de que não conseguiria reagir, os cronistas, pela TV ou pelo Twitter, começaram a enumerar os erros de Dunga. Erros que haviam sido apontados antes de a Copa do Mundo começar, ok, mas que foram sumindo dos argumentos durante a disputa, sobretudo após as vitórias sobre Costa do Marfim e Chile. No futebol é assim: o resultado pauta a opinião. Afinal, se jornalista esportivo relatasse a verdade – o Brasil perdeu porque a Holanda jogou melhor e fez mais gols – morreria de fome. Precisa especular, esmiuçar, fantasiar até.

Mas, passados alguns dias da eliminação, a cabeça está mais fresca, as ideias mais organizadas, descontaminadas da frustração. No dia do jogo, por exemplo, Felipe Melo recebeu o rótulo de vilão por protagonizar todos os lances capitais. Revendo a partida, percebi a expulsão foi sua única falha – suficiente para ter atrapalhado a equipe, é verdade, e merecer o rótulo. Mas, no primeiro gol holandês, é Julio Cesar quem comete o equívoco de não gritar ‘Minha!’ e sair soberano na bola. No segundo, vendo o lance desde o início, percebe-se que é Gilberto Silva quem está marcando Sneijder. Ele cochila, olha para a bola ao invés do adversário.

Foi simples assim: Sneijder desequilibrou – como Zidane em 1998 e 2006 -, a Holanda jogou melhor e venceu. Se fosse melhor de três, o Brasil venceria as outras duas. Era melhor time, prova disso foi o soberbo primeiro tempo, de encher os olhos, com lampejos da tão sonhada arte que os ranzinzas pedem. Mas o futebol é maravilhoso exatamente porque escreve a sua história de forma tortuosa.

É claro que Dunga poderia ter convocado melhor. Mas os reservas em potencial de Kaká – Ronaldinho e Diego – foram mal com a Amarelinha, quando chamados por ele. Ganso? Seria maravilhoso. Seria? Uma pergunta que já nasceu sem resposta. Difícil imaginar como o garoto se comportaria na Copa do Mundo. Eu arrisco que teria sucesso. Mas arriscar não foi um verbo muito usado no mandato de Dunga na Seleção.

Mesmo que Dunga tivesse apenas acertado - o que não foi o caso - não sairia ileso de sua experiência como treinador da Seleção

Não concordo com o coro de que o treinador aplicou a filosofia do antifutebol, sem raízes brasileiras, nem acho que o quartel que montou na concentração foi de todo ruim. Foi uma postura paternal, de proteger os jogadores, que aparentemente ganhou a aprovação deles – talvez exceção feita a Robinho, que teve problemas ao conceder entrevista fora de hora e viu sua esposa reivindicar uma visita.

Dunga montou um time equilibrado, aplicado taticamente, veloz no contra-ataque. Muito parecido com o que a Alemanha tem feito. Os germânicos estão encantando o mundo com um futebol sem firulas – que a parcela mal humorada da imprensa brasileira diz que é arte, só para cutucar.

Enfim, o Brasil perdeu. Sexto lugar é pouco para o tamanho de sua história. Mas não se pode jogar quatro anos de trabalho no lixo, malhar um ex-capitão, campeão do mundo. Era bem intencionado. Queria acertar. Por aqui, a impaciência com ele não foi por causa de sua postura um tanto arrogante, sua falta de tato com a imprensa. Afinal, o rabugento Muricy Ramalho é cult. O problema é que técnico da Seleção não pode errar…

Ah! Antes que você dê sequências àquelas ridículas correntes conspiratórias de que o o Brasil vendeu-se em 1998 – e que, agora, trocou a taça de 2014 para entregar nessa, por favor – reveja as entrevistas de Julio Cesar aos prantos. Uma Copa do Mundo não tem preço.